Atendendo a pedido feito pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO), por intermédio da Promotoria de Justiça de Santa Terezinha de Goiás, em ação civil pública (ACP), a juíza Zulailde Viana Oliveira, titular da comarca local, em antecipação de tutela, determinou que o município promova as adequações do Decreto Municipal 579/2020, que flexibilizou as atividades comerciais e de serviços da cidade, ao Decreto Estadual 9.653/2020. Na ACP, a promotora de Justiça Wanessa de Andrade Orlando solicitou também que todas as medidas da prefeitura sejam tomadas com base em evidências científicas, frente aos riscos de contaminação da população pela Covid-19.
Wanessa de Andrade Orlando, ao propor a ACP, levou em consideração as vulnerabilidades do município, que não conta com aparelho respirador nem leito de unidade de terapia intensiva (UTI), bem como com estrutura suficiente para atender pacientes em casos de alta complexidade. Ela ressaltou que a prefeitura entendeu os dispositivos do decreto estadual como permissivos para que pudesse estabelecer, sem base científica, regras permitindo o funcionamento de academias, restaurantes e outros setores da economia, sem amparo em nota técnica sanitária.
O MP-GO também já havia encaminhado ao prefeito recomendação alertando acerca da necessidade de editar decreto fundamentado em parecer técnico emitido por autoridade sanitária local. Este documento deveria conter avaliação de risco epidemiológico diário das ameaças, explicitando fatores como a incidência, mortalidade, letalidade, entre outros, e vulnerabilidades – disponibilidade de testes, leitos com respiradores, recursos humanos e equipamentos de proteção individual. Não houve resposta do gestor municipal.
Ao proferir a decisão, a juíza afirmou que o município, dentro de sua competência constitucional, pode editar decretos relacionados ao coronavírus. No entanto, este não pode divergir do Decreto Estadual 9.653/2020, que estabelece as regras para flexibilização das atividades, o que não ocorreu. “Em que pese os esforços dos profissionais da saúde, há clara vulnerabilidade do sistema de saúde local, ante a inexistência de leito de UTI e respiradores, e tudo indica que, se a situação regional se equiparar a outros locais do Brasil, o sistema de saúde chegará ao colapso ou bem próximo a isso”, escreveu.
Segundo a magistrada, o município, sem base técnica e científica, não pode flexibilizar aquilo que o Estado restringiu, já que qualquer norma editada pelo município tratando da matéria, sem amparo em norma técnica sanitária, é indevida e inconstitucional. “Os princípios da prevenção e da precaução se impõem para a proteção da saúde. Uma flexibilização das normas sanitárias desprovida de amparo científico pode potencializar a contaminação pela Covid-19 e colocar ainda mais em risco a saúde pública no Estado e municípios”, explicou.
Fiscalização
Para a juíza, também constitui fato gravíssimo a suspensão da fiscalização que os funcionários do município estavam fazendo. “É notório que a fiscalização não vem sendo realizada a contento em Santa Terezinha de Goiás. No atual contexto, são exigidas do poder público medidas preventivas e repressivas, excepcionais e definitivas de controle, sendo que as ferramentas já existentes no Direito Administrativo se mostram insuficientes” afirmou, reiterando que situações drásticas e incomuns, como a calamidade gerada pela Covid-19, exigem do poder público providências excepcionais, a exemplo do controle da legalidade dos atos administrativos pelo Poder Judiciário.
A magistrada afirmou que também gostaria que a economia retornasse à normalidade e que se sentia sensibilizada ao ver empresários, profissionais liberais, trabalhadores informais e as pessoas mais carentes sendo diretamente castigados com o isolamento social, e, os seus efeitos. “Contudo, entendo que a vida e a saúde, quando em conflito com o interesse econômico, deve aquelas prevalecerem”, reforçou.
O município, de acordo com a decisão judicial, deverá também utilizar evidências científicas e análises de informações estratégicas em saúde ao editar qualquer medida de flexibilização. Terá de promover a divulgação, inclusive com a utilização de carros de som, para toda a população, sobre quais serão os cuidados e precauções quanto ao necessário distanciamento, uso de máscaras, ainda que caseiras, e outros equipamentos de proteção individual (EPIs), pelos trabalhadores e usuários dos serviços, dentre outras medidas, como condição para abertura e funcionamento das atividades econômicas.
Deverá o município assegurar ainda que qualquer anúncio de retomada de atividades, seja precedido de comunicação para manutenção do isolamento social voluntário, indicando que a circulação de pessoas deve se restringir às atividades necessárias, com o uso obrigatório de máscara facial. Terá de comprovar, documentalmente, as medidas e sanções administrativas aplicadas até o momento, em decorrência de fiscalização sobre o cumprimento dos termos do decreto então vigente, bem como eventuais encaminhamentos feitos à autoridade policial para adoção de procedimentos criminais cabíveis. Foi fixada multa diária de R$ 1 mil, ao município, em caso de descumprimento. (Texto: João Carlos de Faria/Arte: Chico Santos – Assessoria de Comunicação Social do MP-GO)
Foto: Drone Cerrado